02/04/2010

Um problema de imagem


Genista tournefortii Spach

Esta planta, ao contrário de várias congéneres suas de marcada vocação bélica, não vem armada de espinhos aguçados para nos tolher o passo. O género Genista é polimorfo: inclui plantas agressivamente eriçadas, outras sem quaisquer espinhos, e ainda uma terceira categoria em que os acúleos estão presentes mas não incomodam muito. As da primeira classe levam o nome de tojos (designação mais vulgarmente aplicada ao género Ulex), as da segunda classe chamam-se giestas (mas as giestas mais comuns são do género Cytisus), e as da terceira classe - que abrange a G. tournefortii, com espinhos ramificados nas axilas das folhas - não parecem ter, em português, qualquer nome comum.

Estamos assim perante um óbvio problema de identidade. O género Genista não é uma marca forte, nem possui uma imagem que o público claramente identifique. Até lhe roubaram o nome latino que era seu por direito, genista, não sem antes o estropiarem para giesta nesta língua bárbara que é a nossa. Uma empresa de consultoria, daquelas que têm a poção mágica para resolver todos os problemas do mundo (ou tinham, antes de a crise lhes deixar a careca à mostra), recomendaria uma aposta decidida naquilo que o género Genista tem de distintivo. Só assim, valorizando a diferença, é que ele pode esperar impor-se no mercado. (Qual mercado? - pergunta o leitor já confundido. Não estou bem certo, mas diz a cartilha dos magos consultores que hoje em dia tudo se vende e tudo se compra. Também será assim, suponho, no reino vegetal.)

Esta estratégia de reposicionamento tem na Genista tournefortii o seu elemento-chave. De facto, este arbusto rasteiro (até 50 cm de altura), penugento, com ramos por vezes ascendendentes, que floresce de Abril a Junho e habita na faixa litoral do território português que se estende do Mondego ao Alentejo - este arbusto, dizíamos, não se confunde com um tojo nem com uma giesta. Por um lado, falta-lhe a agressividade espinhenta; por outro, as suas folhas são simples, em vez de serem trifoliadas. A maioria das giestas, aliás, nem tem folhas que se vejam, ou por serem minúsculas, ou por caírem ainda antes da floração. Só falta baptizar a G. tournefortii com um nome sonante para dar início à campanha. Que tal giesta-mansa?

Por coincidência, ainda há poucos dias aqui apareceu uma mostarda com o epíteto tournefortii. Refere-se ele a Joseph Pitton de Tournefort (1656–1708), botânico francês que foi um dos precursores de Lineu, e em cuja obra Élémens de botanique (1694) as plantas já aparecem agrupadas por géneros. Ao estabelecer a proximidade entre espécies, Tournefort olhou para as flores, atendendo sobretudo ao número e ao arranjo das pétalas. Lineu (1707–1778), embora também valorizasse as flores, decretou que as pétalas eram irrevelantes: o que interessava eram os orgãos sexuais (estames, ovários, etc.). As pétalas tinham apenas a incumbência, por vezes dispensável, de fornecer o leito nupcial.

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